16/02/2014

MUDEI DE VIDA (ou ai meu Deus, que ela usa palavras que não se pronunciam...)

É uma constante a revisitação do tema pelas newsmagazines da praça. Mudar para o campo, mudar de emprego, mudar os miúdos de escola, mudar hábitos. Tão constante como a picada na nuca que nos impede de ignorar que o verbo "mudar" é SEMPRE aquele que nos move.
Nos últimos cinco anos a picada na minha nuca foi sempre constante. Às vezes muito, muito intensa. Por vezes apaziguada pela régua e esquadro da rotina quotidiana. Mas sempre presente. E muitas vezes açaimada.
Em 2012, decidi procurar-me de forma mais intensa. "Procurar-nos", "encontrar-nos", são os HIT VERBS das revistas femininas. Andamos todas perdidas e todas à procura. Já não é da cara-metade, é de nós próprias... Não será bem assim, mas enfim. De modo não imediatamente consciente, 2012 marcou a procura ativa. Apenas no mesmo caminho de sempre, o Direito, um trilho absolutamente torto. Mas as lições que estranhei e entranhei a custo, a partir dos 29, permitiram-me ir descascando a cebola pelas "camadas negativas": foi colocando de parte o que me fazia profundamente infeliz. Como disse Pessoa, repetir locais onde somos infelizes é apenas estupidez manifesta. Eu andei dez anos da minha vida a repetir um desses locais: a Faculdade de Direito de Lisboa. Se há coisa que eu adore, é ensinar. É a exposição do conhecimento a cabeças e olhares frescos e novos, é a interatividade possível, e o aperfeiçoamento coletivo. Se há coisa que eu deteste, é a trica mesquinha. A inveja pequena, a guerrilha académica permanente, o tribalismo escolar entre as políticas, as jurídicas, as económicas, a malha de tramas urdida por intelectos superiormente preparados para os nós mais complicados. Isto é 90 por cento da vida de um assistente na FDL. Os demais 10 por cento sim, são o que eu adoro. Em Setembro de 2012, ao ser-me distribuída para o semestre a cadeira de Economia I, que no essencial versa sobre microeconomia e no nuclear deve ser ensinada por quem tenha formação em Economia e não em Direito, demiti-me. E as minhas costas ficaram 300 toneladas mais leves.
Mas a insistência no Direito permaneceu. Afinal, foram 5 anos de Licenciatura, 4 de Mestrado, não sei quantas Pós-Graduações e Especializações. Foram 5 livros publicados pela Almedina, generosas dezenas de artigos publicados em revistas científico-jurídicas, participações em seminários e conferências. Então não foram 10 anos de docência na FDL, 3 anos sobre a orientação do meu Saudoso Mestre Professor Sousa Franco, a participação intensa num processo legislativo que adorei, 2 anos de assento na Assembleia da República e a seguir a advocacia? Sim, foi isto tudo. Foram 12 anos em que a minha formação jurídica me deu experiências tão intensas, daquelas que a generalidade das pessoas não vão experimentar numa vida inteira, me deu tudo a que me propus com sucesso. TERÁ SIDO O DIREITO A DAR-ME, OU EU - A MARTA - A CONQUISTAR? Foram 12 anos. E não serão 13.
Ao longo deste sinuoso percurso, doutorei-me em pessoas e sua infinita maldade e inveja, vacinei-me contra mau-olhado e mesquinhez, e tornei-me, nas palavras de quem me rodeia "brava e generosa". Levei muitos pontapés, biqueiradas mesmo, mas dei muitas outras. "Quem vai à guerra, dá e leva". Aturei a exposição, joguei com ela. Fui a jogo sempre, fiquei doente muitas vezes. Lidei com uma depressão profunda durante metade da minha passagem pelo Parlamento que levei quando sai. Sim, escândalo: ela está a dizer a palavra D-E-P-R-E-S-S-Ã-O. Aquela doença que afeta 90 por cento das pessoas que nos rodeiam, mas finge-se sempre a operacionalidade e que estamos supimpas. Acompanhou-me uns aninhos. É a vida. Nunca perdi uma batalha, mas aprendi que só algumas batalhas valem a pena. Tenho a certeza absoluta que NESTE PAÍS A CAUSA PÚBLICA É EXERCIDA COM O UMBIGO E O LADO ESQUERDO DO CÉREBRO, e o CORAÇÃO pouco tem a ver com o assunto. Aprendi que tenho a obrigação de mudar um bocadinho do mundo porque consigo, mas O MUNDO MUDA-SE COM AS NOSSAS PRÓPRIAS MÃOS, E NÃO POR ELEIÇÃO. Que prefiro CAUSAS a POLÍTICAS. Que milito na vida, e não num partido. Que vida é vida, quantas patas e de que espécie, raça, cor seja. E que DEUS EXISTE. Numa concepção minha, e sem lhe pedir que viva por mim: o destino faz-se e merece-se.
Em 2013 continuei a teimar que era o Direito, e os dias a dizerem-me que era a torto. A picada na nuca picava muitíssimo, e a visita de um simpático cancro não permitia quebrar o ciclo. Tudo isto é um PROCESSO. De aprendizagem, de SELF-LEARNING e SELF-KNOWLEDEG. Se o ano há pouco encerrado foi uma sucessão de desgraças e más notícias, foi também um ano de chegadas e permanências: dos meus miúdos, da minha filha (humana) adotiva, do meu melhor amigo que é a "minha família super-concentrada" e tudo para e por mim, a tua descoberta. E de cerejinhas: EU NÃO GOSTO DE FAZER DO DIREITO VIDA. Não reside ali a minha felicidade. Há que encontrá-la, tão certo como o depósito da renda ao fim do mês.
O que eu decidi fazer da minha vida, a partir deste Fevereiro que me vê renascer a cada dia 13, é o resultado de um processo muito duro e longo de tareia, nódoas negras, músculos doridos, desilusões, erros e galos na cabeça. Mas de coisas maravilhosas que fui trazendo comigo de ano para ano. Que só hoje sei o que valem. Eu tinha um plano compacto e inflexível para a minha vida. Que falhou redondo no chão. Estava errada, e então?
Cansei de ser a Senhora Dra. Marta Rebelo. Não serve "Marta"? O Senhor está no alto é parece que é no masculino. Doutores, só mesmo em hospitais e locais afins. Não gosto do quadro, do quadrado, do rectângulo e do mesclado de cinzentos do mundo jurídico. Prefiro tentar moldar as formas e escolher a minha geometria.
Aos detratores: olhem bem para vocês... em frente a um espelho grande e nítido.
Aos maldizentes: continuem a perder tempo com a minha vida, a vossa é pouquinho, não é?
Aos que invejam: façam (por) vocês mesmos.
Aos que clamam "é tão fútil": e vocês tão quadrados(errados).
Aos que proclamam "inconstância": não acredito em pessoas absolutamente certas. Um espelho, por favor.
Aos que me acham "muito corajosa": não sou, sou normal, também receio, procurem o vosso "normal".
Aos que se afastam: ainda bem que perceberam que estavam a mais, peso-morto.
Aos que se aproximam: desculpem lá, só agora é que estou pronta!
Aos que torcem: obrigada, o karma é tramado mas justo.

Ah, também me cansei de ser morena. Deve ser porque estou ligeira e leve.
Até já, do lado bom (ou melhor) da vida.

7 comentários:

  1. Olá Marta,
    cheguei aqui porque adoro "roupinhas" e encontrei um texto lindo (que li várias vezes) - uma lufada de ar fresco!
    penso que todas nos identificamos com as as suas palavras
    obrigado e que a vida lhe de tudo aquilo que merece!
    Rita

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    1. Olá Rita!
      Muito obrigada pelo seu feedback e palavras que me deixam sempre feliz e (ainda) mais segura das minhas decisões :-)
      Eu também adoro "roupinhas" e toda a sua vizinhança. Espero que a Rita venha visitar-me aqui todos os dias, eu prometo tentar fazer ventania da boa e escrever coisas boas, interessantes, giras, inspiradoras, Para as Not A WonderWomen, que somos todas nós.
      Um Wonder kiss, Rita!
      Até já

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  2. Tão bom! Saber. Sentir. Estar pronta.

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  3. Marta, nem sei como aqui vim parar.
    Espero que o mau vento se transforme em suave brisa e que a nova Marta encontre e seja feliz - muito - nessa nova rota.
    E se entender mudar de novo é direito seu: faça-o. Porque a mudança faz parte da vida!
    Um abraço

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    1. Querida Helena, muito obrigada!
      Um grande beijinho e saudades

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